Kawo Kabiyesi le!
Xangô era filho de Oranian, valoroso
guerreiro, cujo corpo era preto à direita e branco à esquerda. Homem valente à
direita, homem valente à esquerda. Homem valente em casa, homem valente na
guerra.
Oranian foi o fundador do Reino de Oyó, na
terra dos iorubas. Durante suas guerras, ele passava sempre por Empé, em território
Tapá, também chamado Nupê.
Elempê, o rei do lugar, fez uma aliança com
Oranian e deu-lhe, também, sua filha em casamento. Desta união nasceu este
filho vigoroso e forte, chamado Xangô.
Durante sua infância em Tapá, Xangô só
pensava em encrenca. Encolerizava-se facilmente, era impaciente, adorava dar
ordens e não tolerava reclamação. Xangô só gostava de brincadeira de guerra e
de briga.
Comandando os pivetes da cidade, ele ia
roubar os frutos das árvores. Crescido, seu caráter valente o levou a partir em
busca de aventuras gloriosas. Xangô tinha um oxé – machado de duas lâminas;
tinha, também, um saco de couro, pendurado no seu ombro esquerdo. Nele
encontravam-se os elementos do seu poder ou axé: aquilo que ele engolia para
cuspir fogo e amedrontar, assim, seus adversários, e a pedra de raio com as
quais ele destruía as casas de seus inimigos.
O primeiro lugar que Xangô visitou chamava-se
Kossô. Aí chegando, a pessoas assustadas disseram: "Quem é este perigoso
personagem?" "Ele é brutal e petulante demais!" "Não o
queremos entre nós!" "Ele vai atormentar-nos!" "Ele vai
maltratar-nos!" "Ele vai espalhar a desordem na cidade!"
"Não o queremos entre nós!" Mas Xangô os ameaçou com seu oxé. Sua
respiração virou fogo e ele destruiu algumas casas com suas pedras de raio.
Todo mundo de Kossô veio pedir-lhe clemência,
gritando: Kabiyei Sango, Kawo Kabiyei Sango Obá Kossôf "Vamos todos ver e
saudar Xangô, Rei de Kossô!"
Quando Xangô tornou-se rei de Kossô, ele
pôs-se à obra. Contrariamente ao que as pessoas desconfiavam e temiam, Xangô
fazia as coisas com alma e dignidade. Ele realizava trabalhos úteis à
comunidade. Mas esta vida calma não convinha a Xangô.
Ele adorava as viagens e as aventuras. Assim,
partiu novamente e chegou à cidade de Irê, onde morava Ogum. Ogum o terrível
guerreiro, Ogum o poderoso ferreiro. Ogum estava casado com Iansã, senhora dos
ventos e das tempestades. Ela ajudava Ogum em suas atividades.
Toda manhã, Iansã o acompanhava à forja e o
ajudava, carregando suas ferramentas. Era ela, ainda, que acionava os
sopradores para atiçar o fogo. O vento soprava e fazia: fuku, fuku, fuku. E
Ogum batia sobre a bigorna: beng, beng, beng...
Xangô gostava de sentar-se ao lado da forja
para ver Ogum trabalhar. Vez por outra, ele olhava para Iansã. Iansã, também,
espiava furtivamente Xangô. Xangô era vaidoso e cuidava muito da sua aparência,
a ponto de trançar seus cabelos como os de uma mulher. Ele fizera furos nos lobos
de suas orelhas, onde pendurava argolas. Usava braceletes e colares de contas
vermelhas e brancas. Que elegância!
Muito impressionada pela distinção e pelo
brilho de Xangô, Iansã fugiu com ele e tornou-se sua primeira mulher. Xangô
voltou por pouco tempo a Kossô, seguindo depois, com seus súditos, para o reino
de Oyó, o reino fundado, antigamente, por seu pai Oranian.
O trono estava ocupado por um meio-irmão de
Xangô, mais velho que ele, chamado Dadá – Ajaká – um rei pacífico, que amava a
beleza e a arte. Xangô instalou-se em Oyó, num novo bairro que chamou de Kossô.
E conservou, assim, seu título de Obá Kossô – "Rei de Kossô".
Xangô guerreava para seu irmão Dadá. O reino
de Oyó expandia-se para os quatro cantos do mundo. Ele se estendeu para o
Norte. Ele se estendeu para o Sul. Ele se estendeu para o Leste e ele se
estendeu para o Oeste.
Xangô, então, destronou seu irmão Dadá-Ajaká
e fez-se rei em seu lugar. Kabiyesi Sango Alafin Oyó Alayeluwa! "Viva o
Rei Xangô, dono do palácio de Oyó e Senhor do Mundo!"
Xangô construiu um palácio de cem colunas de
bronze. Ele tinha um exército de cem mil cavaleiros. Vivia entre suas mulheres
e seus filhos. lansã, sua primeira mulher, era bonita e ciumenta. Oxum, sua
segunda mulher, era coquete e dengosa. Obá, sua terceira mulher, era robusta e
trabalhadora.
Sete anos mais tarde, foi o fim do seu reino:
Xangô, acompanhado de lansã, subira à colina Igbeti, cuja vista dominava seu
palácio de cem colunas de bronze. Ele queria experimentar uma nova fórmula que
inventara para lançar raios. Baoummm!!!
A fórmula era tão boa que destruiu todo o seu
palácio! Adeus mulheres, crianças, servos, riquezas, cavalos, bois e carneiros.
Tudo havia desaparecido fulminado, espalhado e reduzido a cinzas. Xangô,
desesperado, seguido apenas de lansã, voltou para Tapá.
Entretanto, chegando a Kossô, seu coração não
suportou tanta tristeza. Xangô bateu violentamente com os pés no chão e
afundou-se terra adentro. lansã, solidária, fez o mesmo em Irá. Oxum e Obá
transformaram-se em rios e todos tornaram-se orixás.
Xangô, orixá do trovão, Kawo Kabiyesi le!
lansã, orixá da tempestade, Êpa Heyi Oiá! Oxum, orixá das águas doces, Orê Yeyê
ô!
FONTE: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed.
Salvador: Corrupio, 1997.
FONTE DA IMAGEM: http://candombleatual.blogspot.com.br/2012/03/xango-arquetipo-do-orixa.html
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