Por Thonny Hawany
Ouvi a expressão “direitos humanos para humanos direitos”, pela primeira vez, numa aula de Direitos Indígenas, nas Faculdades Integradas de Cacoal, Rondônia, ministrada pelo nobre professor Fabrício Fernandes Andrade, o qual, partidário incondicional dos Direitos Humanos, não hesitou em fazer as mais duras críticas ao teor semântico do enunciado e justificou que tal frase constitui, não só uma violência aos Direitos Humanos, mas a tudo o que eles significam e representam como avanço na instituição dos Direitos Fundamentais do Homem.
A anteposição da palavra direitos ou sua posposição à palavra humanos, na frase “direitos humanos para humanos direitos”, parece uma questão corriqueira de estilística; no entanto, do ponto de vista ideológico, não é preciso ser um expert em semântica para ler, na polissemia discursiva do enunciado, as mais claras e mais capciosas intenções construídas para que a frase signifique, segundo a ótica discursiva de quem a cunhou, o que deveria significar à luz de uma ideologia da desordem e da desumanidade.
Na primeira parte do enunciado, Direitos Humanos significam o compêndio teórico e normativo pelo qual se estudam e garantem os Direitos Fundamentais do Homem; na segunda metade, humanos direitos constituem uma clara referência à possibilidade de existirem humanos que são direitos e outros que não o são de acordo com as atitudes de ação de cada um e com a forma como o outro o vê nessas maneiras de ação, visto que, o que é direito para uns, pode não o ser para outrem.
No todo, o enunciado faz um trocadilho infeliz a que adjetivei de infame e, tanto por isso, bifurca-se em duas possibilidades significativas para esta análise: a primeira possibilita ler que os Direitos Humanos servem apenas aos humanos que agem ética e moralmente de acordo com o prisma social; a segunda, no entanto, leva o leitor, sob as influências da ironia, ler que os Direitos Humanos se dignam apenas àqueles que vivem às margens da sociedade, ou seja: àqueles que atentam contra o cidadão de bem.
Sem querer fazer uma análise discursiva e já o fazendo, nas entrelinhas do enunciado “direitos humanos para humanos direitos”, é, absolutamente, possível conhecer de uma ideologia fundamentalista que, muito provavelmente, tenha sido ela a mãe deste slogan infame que o cunhara para lhe servir como marca na sua campanha de oposição aos Direitos Humanos e seus interesses humanísticos e soberanos.
Para a UNESCO, Direitos Humanos são “a proteção de maneira institucionalizada dos direitos da pessoa humana contra os excessos do poder cometidos pelos órgãos do Estado ou regras para se estabelecer condições humanas de vida e desenvolvimento da personalidade humana”. Para a ONU, em sua Declaração dos Direitos do Homem, os Direitos Humanos são aqueles que garantem que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.
Se os Direitos Humanos são para todos sem distinção, não há o que se falar em Direitos apenas para os que são humanos direitos. Se assim o fosse, o Direito perderia sua razão de ser. Como se vê, a intenção do autor ideológico da frase é, capciosamente, restringir a esfera de ação dos Direitos Humanos e também, intencionalmente, depreciar seu nobre objetivo de garantir a todos os seres humanos a devida proteção contra os excessos do Estado e a liberdade de nascerem “livres e iguais em dignidade e direitos”.
Em suma, sem as garantias dos Direitos Humanos, o Homem fica a mercê das ideologias fundamentalistas das classes dominantes e, tanto por isso, a um passo da segregação. Para que não haja um apartheid entre “humanos direitos” e “humanos não direitos”, uma ação fundamental é a preservação do direito a ter direito. É imprescindível que os iguais sejam tratados como iguais e que os desiguais sejam tratados de forma desigual na medida de suas desigualdades. Assim o sendo, os Direitos Humanos cumprirão com a nobre função de dar a cada um o direito que lhe é devido na medida de seu merecimento.
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