quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

OLOFIN-ODUDUA CRIA O MUNDO EM LUGAR DE OXALÁ

Olodumaré, o Deus Supremo, residia no além, no além de um mundo que ainda não existia. Ele aí vivia arrodeado de seiscentos lmalés, as divindades criadas por ele. Duzentos lmalés permaneciam à sua direita. Quatrocentos permaneciam à sua esquerda.

Dos primeiros, pouco falaremos. Eles eram maus, orgulhosos, desleais e mentirosos. Eles discutiam e lutavam sem parar.

Olodumaré não tinha mais um minuto de descanso. Num instante de impaciência e de cólera, ele devolveu ao nada todos os lmalés da direita.

Todos, menos Ogum. Ogum, o valente guerreiro. O homem louco dos músculos de aço que, tendo água em casa, lava-se com angue! E o colocou como guia dos quatrocentos lmalés da esquerda.

Num dia deste passado distante, Olodumaré os convocou e disse: "Eu vou criar um outro lugar. Um lugar que será para vocês. Vocês, aí serão numerosos. Cada um será um chefe e terá um lugar para si. Cada um terá seu poder e seu trabalho próprios".

Deu a todos o que necessitariam e criou, com perfeição, tudo o que prometera. Olodumaré reúne, então, num só lugar, os quatrocentos e um lmalés.

Orunmilá Eleri-Ipin, o testemunho do destino, mantém-se a seu lado. Todos os lmalés deverão pedir-lhe a palavra. Ele mostrará a cada um deles, o caminho a seguir.

O primeiro a responder é Obatalá, o rei do pano branco, chamado, também, Oxalá, o "Grande Orixá". Ele é a segunda pessoa de Olodumaré. É a ele que Olodumaré encarrega de criar o mundo, e lhe dá os poderes (abá e axé) do mundo (é por esta razão que é saudado com a expressão "Alabalaxé").

Obatalá os examina, coloca um sob o boné e o outro dentro do seu saco. O saco da criação que Olodumaré lhe confia. Antes de partir, ele vai a Orunmilá pedir-lhe a palavra, o caminho que ele deverá seguir e o que deverá fazer.

Orunmilá lhe diz: "Olodumaré lhe confiou a criação de um outro lugar. Faça uma oferenda para ser capaz de realizá-la e para que a realize com perfeição".

Obatalá, que é muito obstinado, respondeu: "Oh! Orunmilá! A missão que tens, nós te demos, foi por nós decidida, antes que fosses criado! Olodumaré e eu, Oxalá!

Olodumaré, que é Deus Supremo, me envia em missão. Eu, sua segunda pessoa. Tu, Orunmilá, me dizes agora, que devo fazer oferendas para ser capaz de realizar meu trabalho com sucesso!

Que acontecerá se não faço oferendas? Oferendas para a missão que vou realizar? Eu, portador do poder (abá e axé), alabalaxé! Mas, por que? Que necessidade de fazer oferendas?" Obatalá contradiz Orunmilá. Ele tapa os ouvidos, recusando-se a escutar, e não faz as oferendas.

Todos os outros Imalés vão consultar Orunmilá. Este escolhe para cada um deles uma oferenda determinada. Olofin-Odudua é o que mais se evidencia. É uma espécie de Obatalá. Mas ele não tem posição nem reputação comparáveis às de Oxalá. Orunmilá responde: "Se tu fores capaz de fazer a oferenda que vou te indicar, este mundo que criarei, ele será teu. Lá, tu serás o chefe!"

Olofin pergunta qual é a oferenda. Orunmilá lhe diz que ofereça quatrocentas mil correntes. Que ofereça uma galinha que tenha cinco garras, que ofereça um pombo, que ofereça um camaleão, que ofereça, ainda, quatrocentos mil búzios.

Olofin-Odudua faz a oferenda completa. Chegou o dia de criar o mundo. Obatalá chama todos os outros Imalés. Eles começam a caminhar e se vão. Já na estrada, eles chegam à fronteira do além.

Exu é o guardião (onibode) desta fronteira e o mensageiro dos outros deuses. Obatalá recua-se a fazer oferendas neste lugar, para que a viagem seja feliz. Exu aponta uma cabacinha mágica na direção de Obatalá.

A sede começa a atormentá-lo. Ele vê um dendezeiro. Agita seu cajado de estanho (opaxorô) e se serve dele para perfurar o tronco da palmeira. O vinho escorre copiosamente.

Oxalá se aproxima e bebe à vontade. Ele está plenamente satisfeito, mas fica embriagado. Ele não sabe em que lugar está, nem o que faz. O sono o invade e ele adormece à beira da estrada. Dorme profundamente e ronca.

Todos os outros Imalés sentam-e à sua volta. Respeitosamente, eles não ousam acordá-lo. Esperam que ele acorde espontaneamente.

De repente, Olofin-Odudua levanta-se e apanha o saco da criação, caído ao lado de Obatalá. Ele volta a Olodumaré e diz: "A pessoa que fizeste nosso chefe, aquele a quem entregaste o poder de criar, bebe muito vinho de dendê. Ele perdeu o saco da criação. Eu o trouxe de volta!"

Olodumaré responde: "Ah! Se assim é, tu que encontraste o saco da criação toma-o, vá criar o mundo!" Então, Olofin-Odudua volta aos Imalés reunidos. Toma as quatrocentas mil correntes e, ainda no além, amarra-as a uma estaca.
Ele desce até a extremidade da última corrente, de onde vê uma substância estranha, de cor marrom.

É terra! A galinha de cinco garras voa e vai pousar obre o montícolo. Ela cisca a terra e a espalha sobre a superfície da águas. A Terra se forma e vai e alargando cada vez mais.

Odudua grita: ”Ilè nfè!”(a terra se expande), que veio a ser o nome da cidade santa de Ilê Ifé. Olofin-Odudua coloca o camaleão da oferenda sobre a terra. Ele anda sobre ela com passos cautelosos.

Odudua só ousa descer porque está atado à ponta da corrente. A terra resiste e ele caminha. Seu olhar não pode alcançar os limites. Todos os outros Imalés ainda estão no além. Odudua os convida a descer sobre a terra.

Apenas alguns deles o seguem; os demais permanecem sentados à volta de Obatalá adormecido. Obatalá acorda, enfim. Ele constata que o saco da criação lhe foi roubado.

"Ah! Quem ousou fazer este furto?" Os deuses que permaneceram fiéis lhe dizem: "Foi Odudua que se apoderou do saco da criação".

Ele entende o que ocorreu. Encolerizado, Obatalá volta a Olodumaré e queixa-se do roubo do qual foi vítima. Olodumaré lhe pergunta: "Que fizeste para adormecer assim?"

As pessoas desta época não mentiam jamais. Obatalá, responde com sinceridade: "Eu vi uma palmeira de dendê, furei o seu tronco com o meu opaxorô. Deste furo começou a sair água. Dela eu tomei e adormeci."

"Ah! diz Olodumaré, "não beba mais, nunca mais, desta água. O que fizeste foi grave!" Por esta razão, até hoje, o vinho de dendê é proibido a Oxalá e a seus descendentes.

Olodumaré declarou: "Não tendo criado a Terra, tu criarás todos os seres vivos: os homens, os animais, os pássaros e as árvores".

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.

FONTE DA IMAGEM: http://www.juntosnocandomble.com.br/2014/08/a-lenda-da-criacao-do-mundo-os-orixas.html

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

ORUNMILÁ, REI DO TERCEIRO MUNDO

Ifá é consultado por Obá Jegijegim, o "rei comedor de varetas de pau". Ifá é consultado por Obá Jomijomi, o "rei bebedor de água". Ifá é consultado por Obá Jeunjeun, o "rei comedor de alimentos".

Obá Jegijegi é o nome de Ogum. Quando Olodumaré criou os seres humanos, escolheu Ogum para reinar sobre eles, para conduzí-los ao mundo e cuidar deles. Oferendas foram pedidas a Ogum, antes da sua partida. Ogum não fez as oferendas.

Quando chegou ao mundo, Ogum cortou varetas tenras de madeira pra que os homens comessem. Eles morreram todos e voltaram a Olodumaré. "Não é fácil viver sobre a Terra!" Obá Jomijomi é o nome de Orixá.

Oodumaré voltou a chamar os seres humanos e escolheu o Orixá para suceder Ogum. Oferendas foram pedidas ao Orixá, antes de sua partida. O Orixá recusou-se a fazer as oferendas. Quando chegou na Terra, ele ofereceu água de beber ao seres humanos. Eles beberam, mas morreram todos.

Obá Jeunjeun é o nome de Orunmilá. Antes mesmo que Olodumaré falasse, Orunmilá declarou que ele seria o enviado para substituir o Orixá. Olodumaré concordou: "Muito bem, eu te escolho".

Orunmilá chamou os adivinhos para que eles lhe indicassem as oferenda que deveria fazer. Eles disseram-lhe para preparar muitas sementes. Sementes de legumes tètè, ekuya, milho, feijão, inhame, fava.

Do além, ele espalhou estas sementes sobre a Terra. Elas cresceram ali onde caíram. Havia muitos legumes tètè e ekuya. Foram os ekuya que os homens comeram de início. Foi, depois, a vez dos tètè. Esta foi a alimentação deles, durante muito tempo. O milho amadureceu em seguida e o feijão cresceu; o inhame produziu seus tubérculos.

A Terra tornou-se confortável. Ninguém morreu mais. Os seres humanos se reproduziram e tornaram-se numerosos. Ogum e Orixá ficaram enciumados. O reino deles não tivera sucesso, enquanto o de Orunmilá era uma vitória.

Eles decidiram arruinar a Terra. Orunmilá foi consultar Ifá: "Como proteger a Terra destas criaturas más?" Orunmilá recebeu as seguintes instruções: Ele deveria procurar dois cães, matá-los e cozinhá-los. Preparar inhame e massa de milho, muito vinho de dendê. Matar duas cabras e cozinhá-las, quebrar muitos caramujos e cozinhá-los, levar tudo na encruzilhada Aro, onde todos os Imalés costumam parar, quando vêm a Ifé.

Quando os dois chegaram a Aro, Orunmilá, vestido de branco, foi encontrá-los,
Eles comeram, ficaram satisfeito e disseram: "Foste tu, Orunmilá, que nos preparaste toda esta comida?" Orunmilá respondeu: "Sim". Disseram-lhe, então: "Apenas tu possuis este mundo!" Orunrnilá respondeu: "Eu Orunmilá, não possuo o mundo. São você dois que o possuem". E ele explica a significação desta história: "Os seres humanos devem, logo ao raiar do dia, mastigar varetas de madeira, para limpar os dentes. Após, devem beber água para enxaguar a boca e, apenas em seguida, comer a colheita de Orunmilá". A Terra tornou-se confortável. Nós estamos, agora, no reino de Orunmilá.

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.
FONTE DA IMAGEM: http://setasparaoinfinito.blogspot.com.br/2013/04/lendas-dos-orixas-orunmila-ifa-orula.html


quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

RIVALIDADE ENTRE ORUNMILÁ E OSSAIN

Orunmilá (Elerin Ipin), o testemunho do destino dos seres humanos, está precisando de um criado. Ele vai ao mercado e, entre os escravos que estão à venda, ele escolhe Ossain.

Manda-o desmatar o campo para preparar as novas plantações. Entretanto, para desespero de Orunmilá, Ossain volta à noite, sem ter cumprido sua ordem.

Orunmilá lhe pergunta por que ele nada fez. Ossain lhe responde: "Todas estas plantas, estas folhas e estas ervas têm virtudes.Elas não podem ser destruídas.

Esta folha, por exemplo, acalma as dores de dentes; esta outra, protege contra os efeitos de trabalhos maléficos; esta outra, ainda, cura a febre. Impossível, em verdade, arrancar plantas tão necessárias à saúde e a felicidade!"

Orunmilá impressionado, decide que Ossain deverá, a partir de então, permanecer ao seu lado durante as sessões de adivinhação, para guiá-lo na escolha dos remédios que deverá prescrever a seus consultantes.

Uma surda rivalidade se estabelece, pouco a pouco, entre esses deuses. Ossain, sofrendo por ser mantido em submissão, vangloriava-se de ser mais importante que Orunmilá, pois ele possuía o poder da magia mortal e dos medicamentos que preparava.

Ossain chegou a declarar ao rei Ajalayé que ele viera ao mundo antes de Orunrnilá e, sendo mais antigo, tinha direito a seu respeito.

O rei Ajalayé envia, então, uma mensagem a Orunrnilá. Ele quer saber, entre ele e Ossain, qual o mais importante dos dois. Orunrnilá responde ser ele mais antigo que Ossain.

O rei decide submetê-los a uma prova. Ele os convoca, acompanhados de seus primogênitos. Orunrnilá chega com seu filho, chamado Sacrifício. Ossain apresenta-se com o seu, chamado Remédio.

Os dois serão enterrados durante sete dias. Aquele que sobreviver à provação e responder primeiro, com uma voz clara e forte, ao chamado que será feito, no fim do último dia, verá seu pai ser declarado vencedor.

Duas covas foram abertas. Sacrifício e Remédio foram colocados dentro e as covas foram fechadas.

Orunrnilá, voltando para casa, consultou Ifá. "Meu filho estará ainda vivo, passados os sete dias?" Ifá aconselhou-o a oferecer muito ekuru - um prato saboroso, bolo de feijão, pimenta, um galo, um bode, um pombo, um coelho e dezesseis búzíos da costa.

Orunrnilá preparou a oferenda. Ela foi colocada em quatro lugares: na estrada, numa encruzilhada, diante de Exu e no mercado. Exu exerceu seu poder sobre o coelho sacrificado. Este ressuscitou e cavou um buraco que foi terminar na cova de Sacrifício, o filho de Orunrnilá.

Assim, o coelho levou alimento para ele. Remédio, o filho de Ossain, nada tinha para comer. Mas, ele possuía alguns talismãs que agiam sobre a terra e permitiram-lhe, assim, encontrar Sacrifício no fundo da sua cova.

Remédio pede-lhe comida. Sacrifício responde: "Ah! Como posso eu, filho de Orunmilá, dar-lhe comida, quando há uma disputa em jogo? Tu não vês que assim causarás o sucesso de Ossain, estando vivo para responder ao chamado que será feito no fim dos sete dias?"

Remédio insiste e promete a Sacrifício permanecer calado quando for feito o apelo. Sacrifício, então, dá de comer a Remédio.

E chegou o final da prova. Os juízes chamam o filho de Ossain: "Remédio! Remééédio! Remééééédio! Eles chamam em vão. Remédio não responde. "Bem! Remédio está morto" - concluem eles.

Chamam, depois, o filho de Orunmilá: "Sacrifício !" Imediatamente, escutam um forte sim. Sacrifício está são e salvo! Remédio sai, em seguida, igualmente vivo.

Ossain pergunta ao filho a razão do seu silêncio, quando foi chamado o seu nome. Remédio narra o pacto feito com Sacrifício.

Comida contra silêncio! Este pacto tornou-se provérbio: "Sacrifício não deixa Remédio falar". Significando que sacrifício é mais eficaz que Remédio. Razão pela qual, Orunrnilá tem uma posição mais elevada que Ossain.

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.

FONTE DA IMAGEM: http://www.mundodasmagias.com/orixas/ossanhe/

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

BRIGA ENTRE OXALÁ E EXU

Oxalá e Exu discutiam sobre quem era o mais antigo deles. Exu, decididamente, insiste ser o mais velho. Oxalá, decididamente também, proclama com veemência que já estava no mundo quando Exu foi criado.

O desentendimento entre eles era tal que foram convidados a lutarem entre si, diante dos outros Imalés, reunidos numa assembléia.

Ifá foi consultado pelos adversários e foram, ambos, orientados a fazer oferendas. Oxalá fez as oferendas prescritas. Exu negligenciou a prescrição.

O dia da luta chegou. Oxalá apoiado em seu poder, Exu, contando com a magia mortal e a força dos seus talismãs.

Todos os Imalés estavam reunidos na praça de Ifé. Oxalá deu uma palmada em Exu e boom! Exu caiu sentado, machucado.

Os Imalés gritaram: "Êpa!" Exu sacudiu-se e levantou-se. Oxalá bateu-lhe na cabeça e ele tornou-se anão. Os Imalés gritaram juntos: "Êpa!" Exu sacudiu-se e recuperou seu tamanho.

Oxalá tomou a cabeça de Exu e sacudiu-a com violência. A cabeça de Exu tornou-se enorme, maior que o seu corpo. Os Imalés gritaram juntos: "Êpa!" Exu esfregou a cabeça com as mãos e esta recuperou seu tamanho natural. Os Imalés disseram: "Está bem!

Que Exu mostre agora seu poder sobre Oxalá." Exu caminhava pra lá e pra cá. Ele bateu na própria cabeça e dela extraiu uma pequena cabaça. Ele abriu-a repentinamente e virou-a na direção de Oxalá.

Uma nuvem de fumaça branca saiu da cabaça e descoloriu Oxalá. Os Imalés gritaram juntos: "Êpa!" Oxalá esfregou-se, tentando readquirir sua antiga cor. Mas foi em vão. Ele falou: "Está bem!"

Oxalá desfez o turbante enrolado sobre sua cabeça e, daí, tirou o seu poder (axé). Tocou com ele sua boca e chamou Exu. Exu respondeu com um sim. Oxalá ordenou-lhe: "Venha aqui!" Exu aproximou-se. Oxalá continuou: "Traga sua cabacinha". Exu a entregou nas mãos de Oxalá.

Este a tomou firmemente e a jogou no seu saco. Os Imalés exclamaram: "Êpa!" E disseram: "Oxalá é, sem dúvida, o senhor do poder (axé). O senhor da iniciativa e do poder (alabalaxé).

Tu és maior que Exu. Tu és maior que todos os orixás. O poder de Oxalá ultrapassa o dos demais. Exu não tem mais poder a exercer. Oxalá tomou a cabaça que ele utilizava para o seu poder. "É esta cabaça que Oxalá utiliza para transformar os seres humanos em albinos, fazendo, assim, os brancos, até hoje.

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.

FONTE DA IMAGEM: http://pt.wikipedia.org/wiki/Oxal%C3%A1

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

OXALUFÃ

Êpa Baba!

Oxalufã era o rei de Ilu-ayê, a terra dos ancestrais, na longínqua África. Ele estava muito velho, curvado pela idade e andava com dificuldade, apoiado num grande cajado, chamado opaxorô.

Um dia, Oxalufã decidiu viajar em visita a seu velho amigo Xangô, rei de Oyó. Antes de partir, Oxalufã consultou um babalaô, o adivinho, perguntando-lhe se tudo ia correr bem e se a viagem seria feliz.

O babalaô respondeu-lhe: "Não faça esta viagem! Ela será cheia de incidentes desagradáveis e acabará mal." Mas, Oxalufã tinha um temperamento obstinado, quando fazia um projeto, nunca renunciava.

Disse, então, ao babalaô: "Decidi fazer esta viagem e eu a farei, aconteça o que acontecer!" Oxalufa perguntou ainda ao babalaô, se oferendas e sacrifícios melhorariam as coisas.

Este respondeu-lhe: "Qualquer que sejam suas oferendas, a viagem será desastrosa." E fez ainda algumas recomendações: "Se você não quiser perder a vida durante a viagem, deverá aceitar fazer tudo que lhe pedirem.

Você não deverá queixar-se das tristes consequências que advirão. Será necessário que você leve três panos brancos. Será necessário que você leve, também, sabão e limo da costa."

Oxalufã partiu, então, lentamente, apoiado no seu opaxorô. Ao cabo de algum tempo, ele encontra Exu Elepô, Exu "dono do azeite de dendê". Exu estava sentado à beira da estrada, com um grande pote cheio de dendê.

"Ah! Bom dia Oxalufã, como vai a família?" "Oh! Bom dia Exu Elepô, como vai também a sua?" "Ah! Oxalufã, ajude-me a colocar este pote no ombro." "Sim, Exu, sim, sim, com prazer e logo."

Mas, de repente, Exu Elepô virou o pote sobre Oxalufã. Oxalufã, seguindo os conselhos do babalaô, ficou calmo e nada reclamou. Foi limpar-se no rio mais próximo. Passou o limo da costa sobre o corpo e vestiu-se com um novo pano; aquele que usava ficou perto do rio, como oferenda.

Oxalufã retomou a estrada, andando com lentidão, apoiado no seu opaxorô. Duas vezes mais ele encontrou-se com Exu. Uma vez, com Exu Onidú, Exu "dono do carvão"; Outra vez, com Exu Aladi, Exu "dono do óleo do caroço de dendê".

Duas vezes mais, Oxalufã foi vítima das armadilhas de Exu, ambas semelhantes à primeira. Duas vezes mais, Oxalufã sujeitou-se às consequências.
Exu divertiu-se às custas dele, sem que, contudo, conseguisse tirar-lhe a calma.

Oxalufã trocou, assim, seus últimos panos, deixando na margem do rio os que usava, como oferendas. E continuou corajosamente seu caminho, apoiado em seu opaxorô, até que passou a fronteira do reino de seu amigo Xangô.

Kawo Kabiyesi, Sango, Alafin Oyó, Alayeluwa! "Saudemos Xangô, Senhor do Palácio de Oyó, Senhor dó Mundo!" Logo, Oxalufã avistou um cavalo perdido que pertencia a Xangô. Ele conhecia o animal, pois havia sido ele que, há tempo, lho oferecera.

Oxalufa tentou amansar o cavalo, mostrando-lhe uma espiga de milho, para amarrá-lo e devolvê-lo a Xangô. Neste instante, chegaram correndo os empregados do palácio. Eles estavam perseguindo o animal e gritaram: "Olhem o ladrão de cavalo!

Miserável, imprestável, amigo do bem alheio! Como os tempos mudaram; roubar com esta idade! Não há mais anciãos respeitáveis! Quem diria? Quem acreditaria?"

Caíram todos sobre Oxalufã, cobrindo-o de pancadas. Eles o agarraram e arrastaram até a prisão. Oxalufã, lembrando-se das recomendações do babalaô, permaneceu quieto e nada disse.

Ele não podia vingar-se. Usou então dos seus poderes, do fundo da prisão. Não choveu mais, a colheita estava comprometida, o gado dizimado; as mulheres estéreis, as pessoas eram vitimadas por doenças terríveis. Durante sete anos o reino de Xangô foi devastado.

Xangô, por sua vez, consultou um babalaô, para saber a razão de toda aquela desgraça. "Kabiyesi Xangô, respondeu-lhe o babalaô, tudo isto é consequência de um ato lastimável. Um velho sofre injustamente, preso há sete anos. Ele nunca se queixou, mas não pense no entanto ... Eis a fonte de todas as desgraças!" Xangô fez vir diante dele o tal ancião.

"Ah! Mas vejam só!"- gritou Xangô. "É você, Oxalufã! Êpa Baba! Exê ê! Absurdo! É inacreditável, vergonhoso, imperdoável!!! Ah! Você Oxalufã, na prisão! Êpa Baba!! Não posso acreditar e, ainda por cima, preso por meus próprios empregados! Hei! Todo vocês! Meus generais! Meus cavaleiros, meus eunucos, meus músicos! Meus mensageiros e chefes de cavalaria! Meus caçadores! Minhas mulheres, as yabás!

Hei! Povo de Oyó! Todos e todas, vesti-vos de branco em respeito ao rei que veste branco! Todos e todas, guardai o silêncio em sinal de arrependimento! Todos e todas, vão buscar água no rio! É preciso lavar Oxalufã! Êpa Baba! Êpa, Êpa! É preciso que ele nos perdoe a ofensa que lhe foi feita!!" Este episódio da vida de Oxalufã é comemorado, a cada ano, em todos os terreiros de candomblé da Bahia, no dia das "Águas de Oxalá" quando todo mundo veste-se de branco e vai buscar água em silêncio, para lavar os axés, objetos sagrados de Oxalá.

Também, com a mesma intenção, todos os anos, numa quinta-feira, uma multidão lava o chão da basílica dedicada ao Senhor do Bonfim que, para os descendentes de africanos dos outro tempos e seus descendentes de hoje, é Oxalufã.

Epa, Epa Baba!!!

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.


FONTE DA IMAGEM: http://www.raizesespirituais.com.br/orixas/oxala/

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

OXAGUIÃ

Exê êêê!

Oxaguiã era o filho de Oxalufã. Ele nasceu em Ifé, bem antes de seu pai tonarar-se o rei de Ifan. Oxaguiã, valente guerreiro, desejou, por sua vez, conquistar um reino. Partiu, acompanhado de seu amigo Awoledjê.

Oxaguiã não tinha ainda este nome. Chegou num lugar chamado Ejigbô e aí tomou-se Elejigbô - "Rei de Ejigbô". Oxaguiã tinha uma grande paixão por inhame pilado, comida que os iorubas chamam de iyan.

Elejigbô comia deste iyan a todo momento; comia de manhã, ao meio-dia e depois da sesta; comia no jantar e, até mesmo, durante a noite, se sentisse vazio seu estômago!

Ele recusava qualquer outra comida, era sempre iyan que devia ser-lhe servido. Chegou ao ponto de inventar o pilão, para que fosse preparado seu prato predileto! Impressionados pela sua mania, os outros orixás deram-lhe um apelido: Oxaguiã, que significa "Orixá-comedor-de-inhame-pilado", e assim passou a ser chamado.

Awoledjê, seu companheiro, era babalaô, um grande adivinho, que o aconselhava no que devia ou não fazer. Certa ocasião, Awoledjê aconselhou Oxaguiã a oferecer: dois ratos de tamanho médio; dois peixes, que nadassem majestosamente; duas galinhas, cujos fígados fosses bem grandes; duas cabras, cujo leite fosse abundante; duas cestas de caramujos e muitos panos brancos.

Disse-lhe, ainda, que se ele seguisse seus conselhos, Ejigbô, que era então um pequeno vilarejo dentro da floresta, tomar-se-ia, muito em breve, uma cidade grande e poderosa e povoada de muitos habitantes.

Depois disto, Awoledjê viajou para outros lugares. Ejigbô tomou-se uma grande cidade, como previra Awoledjê. Ela era cercada de muralhas com fossos profundos, as portas fortificadas e guardas armados vigiavam suas entradas e saídas.

Havia um grande mercado, em frente ao palácio, que atraía, de muito longe, compradores e vendedores de mercadorias e escravos. Elejigbô vivia com pompa entre suas mulheres e seus servidores.

Músicos cantavam seus louvores. Quando falava-se dele, não se usava jamais o seu nome, pois seria falta de respeito. Era a expressão Kabiyesi, isto é, Sua Majestade, que deveria ser empregada.

Ao cabo de alguns anos, Awoledjê voltou. Ele desconhecia ainda o novo esplendor de seu amigo. Chegando diante dos guardas, na entrada do palácio, Awoledjê pediu, com familiaridade, notícias do "Comedor-de-inhame-pilado".

Chocados pela insolência do forasteiro, os guardas gritaram: "Que ultraje falar desta maneira de Kabiyesi! Que impertinência! Que falta de respeito!" E caíram sobre ele dando-lhe pauladas e cruelmente jogaram-no na cadeia.

Awoledjê, mortificado pelos maus tratos, decidiu vingar-se, utilizando sua magia. Durante sete anos a chuva não caiu sobre Ejigbô, as mulheres não tiveram mais filhos e os cavalos do rei não tinham pasto.

Elejigbô, desesperado, consultou um babalaô para remediar esta triste situação. Este respondeu-lhe: "Kabiyesi, toda esta infelicidade é resultado da injusta prisão de um de meus confrades!

É preciso soltá-lo, Kabiyesi! É preciso obter o seu perdão!" Awoledjê foi solto e, cheio de ressentimento, foi-se esconder no fundo da mata. Elejigbô, apesar de rei tão importante, precisou ir suplicar-lhe que esquecesse os maus tratos sofridos e o perdoasse.

"Muito bem! - respondeu-lhe. Eu permito que a chuva volte a cair, Oxaguiã, mas tem uma condição: cada ano, por ocasião da sua festa, será necessário que você envie muita gente à floresta, cortar trezentos feixes de varetas. Os habitantes de Ejigbô, divididos em dois campos, deverão golpear-se, uns aos outros, até que estas varetas estejam gastas ou se quebrem".

Desde então, todo os anos, no fim da seca, os habitantes de dois bairros de Ejigbô, aqueles de Ixalê Oxolô e aqueles de Okê Mapô, batem-se todo um dia, em sinal de contrição, e na esperança de verem, novamente, a chuva cair.

A lembrança deste costume conservou-se através dos tempos e permanece viva também na Bahia. Por ocasião das cerimônias em louvor de Oxaguiã, as pessoas batem-se umas nas outras, com leves golpes de vareta ... e recebem, em seguida, uma porção de inhame pilado, enquanto Oxaguiã vem dançar com energia, trazendo uma mão de pilão, símbolo das preferências gastronômicas do orixá "Comedor-de-inhame-pilado".

Exê ê! Baba Exê ê!

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.

FONTE DA IMAGEM: http://www.vibeflog.com/adriano67/p/23467226 

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

DISPUTA ENTRE NANÃ BURUKU E OGUM

Nanã Buruku é uma velhíssima divindade das águas, vinda de muito longe e há muito tempo. Ogum é um poderoso chefe guerreiro que anda sempre à frente dos outros Imalés. Um dia, eles vão a uma reunião. É a reunião dos duzentos Imalés da direita e dos quatrocentos Imalés da esquerda.

Eles discutem sobre os seus poderes. Eles falam muito sobre Obatalá, aquele que criou os seres humanos. Eles falam sobre Orunmilá, o senhor do destino dos homens. Eles falam sobre Exu: "Ah! É um importante mensageiro!"

Eles falam muita coisa a respeito de Ogum. Ele dizem: "É graças a seus instrumentos que nós podemos viver. Declaramos que é o mais importante entre nós!" Nanã Buruku contesta, então: "Não digam isto. Que importância tem, então, os trabalhos que ele realiza?"

Os demais orixás respondem: "É graças a seus instrumentos que trabalhamos pelo nosso alimento. É graças a seus instrumentos que cultivamos os campos.
São eles que utilizamos para esquartejar os animais".

Nanã conclui que não renderá homenagem a Ogum. "Por que não haverá um outro lmalé mais importante?" Ogum diz: "Ah! Ah! Considerando que todos os outros lmalés me rendem homenagem, me parece justo, Nanã, que você também o faça".

Nanã responde que não reconhece sua superioridade. Ambos discutem por muito tempo. Ogum perguntando: "Você pretende que eu seja dispensável?" Nanã garantindo que isto ela podia afirmar dez vezes. Ogum diz então: "Muito bem! Você vai saber que sou indispensável para todas as coisas."

Nanã, por sua vez, declara que, a partir daquele dia, ela não utilizará, absolutamente nada, fabricado por Ogum e, ainda assim, poderá tudo realizar.

Ogum questiona: "Como você o fará? Você não sabe que sou o proprietário de todos os metais? Estanho, chumbo, ferro, cobre. Eu os possuo todos."

Os filhos de Nanã eram caçadores. Para matar um animal, eles passaram a se servir de um pedaço de pau, afiado em forma de faca, para esquartejá-lo.

Os animais oferecidos a Nanã são mortos e decepados com instrumentos de madeira. Não se pode utilizar faca de metal para cortar sua carne, por causa da disputa que, desde aquele dia, opôs Ogum a Nanã.

FONTE DO TEXTO: VERGER,  Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.

FONTE DA IMAGEM: http://omidewa.com.br/public_html/arquivos/1183

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

OBALUAÊ

Atotô!

Xapanã nasceu em Empê, no território Tapá, também chamado Nupê. Era um guerreiro terrível que, seguido de suas tropas, percorria o céu e os quatro cantos do mundo. Ele massacrava sem piedade aqueles que se opunham à sua passagem. Seus inimigos saíam dos combates mutilados ou morriam de peste. Assim, chegou Xapanã em território Mahi, no Daomé. A terra dos mahis abrangia as cidades de Savalú e Dassa Zumê.

Quando souberam da chegada iminente de Xapanã, os habitantes desta região, apavorados, consultaram um adivinho. E assim ele falou: "Ah! O grande Guerreiro chegou de Empê! Aquele que se tornará o senhor do país! Aquele que tornará esta terra rica e próspera, chegou! Se o povo não aceitá-lo, ele o destruirá! É necessário que supliquem a Xapanã que vos poupe. Façam-lhe muitas oferendas; todas as que ele goste: inhame pilado, feijão, farinha de milho, azeite de dendê, picadinho de carne de bode e muita, muita pipoca! Será necessário, também, que todos se curvem diante dele, que o respeitem e o sirvam. Desde que o povo o reconheça como pai, Xapanã não o combaterá, mas protegerá a todos!"

Quando Xapanã chegou, conduzindo seus ferozes guerreiros, os habitantes de Savalú e Dassa Zumê reverenciaram-no, encostando suas testas no chão, e saudaram-no: Totô hum! Totô hum! Atotô! Atotô! "Respeito e submissão!"

Xapanã aceitou os presentes e as homenagens, dizendo: "Está bem! Eu os pouparei! Durante minhas viagens, desde Empê, minha terra natal, sempre encontrei desconfiança e hostilidade. Construam para mim um palácio. É aqui que viverei a partir de agora!"

Xapanã instalou-se assim entre os mahis. O país prosperou e enriqueceu, " e o Grande Guerreiro não voltou mais a Empê, no território Tapá, também hamado Nupê.

Xapanã é considerado o deus da varíola e das doenças contagiosas. Ele tem, também, o poder de curar. As doenças contagiosas são, na realidade, punições aplicadas àqueles que o ofenderam ou conduziram-se mal.

Seu verdadeiro nome, é perigoso demais pronunciar. Por prudência, é preferível chamá-lo Obaluaê, o "Rei, Senhor da Terra" ou Omulú, o "Filho do Senhor".

Quando Xapanã instalou-se entre o mahis, recebeu, em uma nova terra, o nome de Sapatá. Aí, também, era preferível chamá-lo Ainon, o "Senhor da Terra", ou, então, Jeholú, o "Senhor das Pérolas".

O fato de ser chamado Jeholú e Ainon causou mal-entendidos entre Sapatá e os reis do Daomé, pois eles também usavam estes títulos. Enciumados, os Jeholú de Abomey expulsaram, várias vezes, Jeholú Ainon do Daomé e obrigaram-no a voltar, transitoriamente, à terra dos mahis. Jeholú Ainon vingou-se: vários reis daomeanos morreram de varíola!

Atotô!

FONTE DO TEXTO: VERGER,  Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.

FONTE DA IMAGEM: http://www.ceuue.com.br/arquivo/inspiracao_0408.html

terça-feira, 25 de novembro de 2014

OXUMARÊ

A run boboi

Oxumaré era, antigamente, um adivinho (babalaô). O adivinho do rei Oni. Sua única ocupação era ir ao palácio real no "dia do segredo"; dia que dá início à semana de quatro dias dos iorubas.

O rei Oni não era um rei generoso. Ele dava apenas, a cada semana, uma quantia irrisória a Oxumaré que, por esta razão, vivia na miséria com a sua família.

O pai de Oxumaré tinha um belo apelido. Chamavam-no "o proprietário do xale de cores brilhantes". Mas, tal como seu filho, ele não tinha poder.

As pessoas da cidade não o respeitavam. Oxumaré, magoado com esta triste situação, consultou Ifá. "Como tornar-se rico, respeitado, conhecido e admirado por todos?"

Ifá o aconselhou a fazer oferendas. Disse-lhe que oferecesse uma faca de bronze, quatro pombos e quatro sacos de búzios da costa.

No momento que Oxumaré fazia estas oferendas, o rei mandou chamá-lo. Oxumaré respondeu: "Pois não, chegarei tão logo tenha terminado a cerimônia".

O rei, irritado pela espera, humilhou Oxumaré, recriminou-o e negligenciou, até, a remessa de seus pagamentos habituais.

Entretanto, voltando à sua casa, Oxumaré recebeu um recado: Olokum, a rainha de um país vizinho, desejava consultá-lo a respeito de seu filho, que estava doente.

Ele não podia manter-se de pé, caía, rolava no chão e queimava-se nas cinzas do fogareiro. Oxumaré dirigiu-se à corte da rainha Olokum e consultou Ifá para ela.

Todas as doenças da criança foram curadas. Olokum, encantada com este resultado, recompensou Oxumaré. Ela lhe ofereceu uma roupa azul, feita de um rico tecido.

Ela lhe deu muitas riquezas, servidores e um cavalo, com o qual Oxumaré retomou à sua casa, em grande estilo.

Um escravo fazia rodopiar um guarda-sol sobre a sua cabeça e músicos cantavam seus louvores. Oxumaré foi saudar o rei.

O rei Oni ficou surpreso e disse-lhe: "Oh! De onde vieste? De onde saíram todas estas riquezas?" Oxumaré respondeu-lhe que a rainha Olokum o havia consultado. "Ah! Foi então Olokum que fez tudo isto por você!"

Estimulado pela rivalidade, o rei Oni ofereceu a Oxumaré uma roupa do mais belo vermelho, acompanhada de muitos outros presentes. Assim, Oxumaré tomou-se rico e respeitado.

Entretanto, Oxumaré não era amigo de Chuva. Quando Chuva reunia a nuvens, Oxumaré agitava sua faca de bronze e a apontava em direção ao céu, como se riscasse de um lado a outro.

O arco-íris aparecia e Chuva fugia. todos gritavam: "Oxumaré apareceu!" Oxumaré tomou-se muito célebre.

Naquela época, Olodumaré, o deus supremo, aquele que estende a esteira real em casa e caminha na chuva, começou a sofrer da vista e nada mais nxergava.

Ele mandou chamar Oxumaré e o mal dos seus olhos foram curados. Depois disto, Olodumaré não deixou mais que Oxumaré retomasse à Terra.

Desde aquele dia, é no céu que ele mora e só tem permissão de visitar a Terra a cada três anos. É durante estes ano que a pessoas tornam-se ricas e prósperas.

FONTE DO TEXTO: VERGER,  Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.
FONTE DA IMAGEM: http://yemanjaogunte.no.comunidades

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

COMO OLOKUM TORNOU-SE A RAINHA DAS ÁGUAS

Olokum, senhora das águas, consulta Ifá, numa época em que suas águas não eram bastantes para que alguém nelas se lavasse o rosto. Se alguém recolhesse água em eu leito, recolheria, também, areia. Porque ela estava pobre de água.

Olossá, senhora da lagoa, consulta Ifá, numa época em que suas águas não eram bastantes para que alguém nelas se lavasse os pés. Se alguém quisesse, com elas, lavar os pés, sujar-se-ia de lama e areia. Pois havia na lagoa muito pouca água.

Olokum e Olossá foram, ambas, aos pés de Orunmilá rogar-lhe examinar o seu caso. Poderiam elas tornar-se as maiores do mundo? Orunmilá respondeu que se elas pudessem fazer as oferendas que ele escolhera para elas, suas vidas seriam um sucesso.

Ele disse que Olokum deveria oferecer duzentas cobertas pretas, duzentas cobertas brancas, um carneiro e vinte e seis mil búzios da costa. Depois, ele recomendou à Olossá fazer o mesmo.

Olokum fez as oferendas. Ela empregou tudo o que possuía. Ela chegou a empregar-se como serva, para completar as oferendas. Olossá fez também as oferendas com tudo o que possuía. Mas suas oferendas não foram completas, porque ela não encontrou onde se empregar.

Oxum, o rio, elegante senhora do pente de coral, consultou Ifá no dia em que ia conduzir todos os rios. Os rios não sabiam em que direção seguir. Eles correriam para frente ou para trás! E haviam pedido conselho a Oxum. Ifá respondeu: "Tu, Oxum, vais a certo lugar e, neste lugar, serás muito bem recebida.

Os outros rios te seguirão. Nenhum outro poderá te preceder em qualquer lugar onde estejas presente." Oxum reuniu todos os rios. E os rios seguiram todos juntos. Quando chegaram à beira da lagoa (osa), eles a cobriram completamente. Quando deixaram a lagoa, eles cobriram completamente o mar (okun).

Colocou-se, então, a questão de saber quem seria a rainha das águas. Olokum declarou: "O território onde vocês se encontram é meu". Eles discutiam aqui e ali. Olodumaré manifestou-se a respeito: "A que possui o território é a rainha".

Olokum foi, por direito, a rainha. Olossá ordenou aos rios que se retirassem das suas terras. Mas, os rios não encontraram saída por onde passar. Assim, Olossá foi eleita segunda pessoa de Olokum. A cada ano, todos os rios vêm adorá-la. Foi assim que Olokum e Olossá tomaram-e populares na Terra e famosas no mundo dos deuses.

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.
FONTE DA IMAGEM: http://www.religiaoindigenaioruba.com/divindades-cultuadas-em-nossa-egbe/olokun/


quarta-feira, 19 de novembro de 2014

IEMANJÁ

Odô Iyâ Yemanjá Ataramagbá, ajejê  lodõ, ajejê nilê!

Iemanjá era a filha de Olokum, a deusa do mar. Em Ifé, ela tornou-se a esposa de Olofin-Odudua, com o qual teve dez filhos. Estas crianças receberam nomes simbólicos e todos tomaram-se orixás. Um deles foi chamado Oxumaré, o Arco-Íris, "aquele-que-se-desloca-com-a-chuva-e-revela-seus-segredos".

De tanto amamentar seus filhos, os seios de Iemanjá tornaram-se imensos. Cansada da sua estadia em Ifé, Iemanjá fugiu na direção do "entardecer-da-terra", como os iorubas designam o Oeste, chegando a Abeokutá.

Ao norte de Abeokutá, vivia Okere, rei de Xaki. Iemanjá continuava muito bonita. Okere desejou-a e propôs-lhe casamento. Iemanjá aceitou mas, impondo uma condição, disse-lhe: "Jamais você ridicularizará da imensidão dos meu seios."

Okere, gentil e polido, tratava Iemanjá com consideração e respeito. Mas, um dia, ele bebeu vinho de palma em excesso. Voltou para casa bêbado e titubeante. Ele não sabia mais o que fazia. Ele não sabia mais o que dizia. Tropeçando em Iemanjá, esta chamou-o de bêbado e imprestável. Okere, vexado, gritou: "Você, com seus seios compridos e balançantes! Você, com seus seios grandes e trêmulos!" Iemanjá, ofendida, fugiu em disparada.

Certa vez, antes do seu primeiro casamento, Iemanjá recebera de sua mãe, Olokum, uma garrafa contendo uma poção mágica pois, dissera-lhe esta: "Nunca se sabe o que pode acontecer amanhã. Em caso de necessidade, quebre a garrafa, jogando-a no chão." Em sua fuga, Iemanjá tropeçou e caiu. A garrafa quebrou-se e dela nasceu um rio. As águas tumultuadas deste rio levaram Iemanjá em direção ao oceano, residência de sua mãe Olokum.

Okere, contrariado, queria impedir a fuga de sua mulher. Querendo barrar-lhe o caminho, ele transformou-se numa colina, chamada, ainda hoje, Okere, e colocou-se no seu caminho.

Iemanjá quis passar pela direita, Okere deslocou-se para a direita. Iemanjá quis passar pela esquerda, Okere deslocou-se para a esquerda. Iemanjá, vendo assim bloqueado seu caminho para a casa materna, chamou Xangô, o mais poderoso dos seus filhos.

Kawo Kabiyesi Sango, Kawo Kabiyesi Obá Kossôl " Saudemos o Rei Xangô, saudemos o Rei de Kossô!" Xangô veio com dignidade e seguro do seu poder. Ele pediu uma oferenda de um carneiro e quatro galos, um prato de "amalá", preparado com farinha de inhame, e um prato de "gbeguiri", feito com feijão e cebola. E declarou que, no dia seguinte, Iemanjá encontraria por onde passar.

Nesse dia, Xangô desfez todos os nós que prendiam as amarras da chuva. Começaram a aparecer nuvens dos lados da manhã e da tarde do dia. Começaram a aparecer nuvens da direita e da esquerda do dia. Quando todas elas estavam reunidas, chegou Xangô com seu raio. Ouviu-se então: Kakara rá rá rá ... Ele havia lançado seu raio sobre a colina Okere. Ela abriu-se em duas e, suichchchch ...

Iemanjá foi-se para o mar de sua mãe Olokum. Aí ficou e recusa-se, desde então, a voltar em terra. Seus filhos chamam-na e saúdam-na: ”Odo Iyá, a Mãe do rio, ela não volta mais. Iemanjá, a rainha das águas, que usa roupas cobertas de pérolas."

Ela tem filhos no mundo inteiro. Iemanjá está em todo lugar onde o mar vem bater-se com suas ondas espumantes. Seus filhos fazem oferendas para acalmá-Ia e agradá-la. Odô Iyá, Yemanjá, Ataramagbá Ajejê lodôl Ajejê nilêl "Mãe das águas, Iemanjá, que estendeu-se ao longe na amplidão. Paz nas águas! Paz na casa!"

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.
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