quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

OLOFIN-ODUDUA CRIA O MUNDO EM LUGAR DE OXALÁ

Olodumaré, o Deus Supremo, residia no além, no além de um mundo que ainda não existia. Ele aí vivia arrodeado de seiscentos lmalés, as divindades criadas por ele. Duzentos lmalés permaneciam à sua direita. Quatrocentos permaneciam à sua esquerda.

Dos primeiros, pouco falaremos. Eles eram maus, orgulhosos, desleais e mentirosos. Eles discutiam e lutavam sem parar.

Olodumaré não tinha mais um minuto de descanso. Num instante de impaciência e de cólera, ele devolveu ao nada todos os lmalés da direita.

Todos, menos Ogum. Ogum, o valente guerreiro. O homem louco dos músculos de aço que, tendo água em casa, lava-se com angue! E o colocou como guia dos quatrocentos lmalés da esquerda.

Num dia deste passado distante, Olodumaré os convocou e disse: "Eu vou criar um outro lugar. Um lugar que será para vocês. Vocês, aí serão numerosos. Cada um será um chefe e terá um lugar para si. Cada um terá seu poder e seu trabalho próprios".

Deu a todos o que necessitariam e criou, com perfeição, tudo o que prometera. Olodumaré reúne, então, num só lugar, os quatrocentos e um lmalés.

Orunmilá Eleri-Ipin, o testemunho do destino, mantém-se a seu lado. Todos os lmalés deverão pedir-lhe a palavra. Ele mostrará a cada um deles, o caminho a seguir.

O primeiro a responder é Obatalá, o rei do pano branco, chamado, também, Oxalá, o "Grande Orixá". Ele é a segunda pessoa de Olodumaré. É a ele que Olodumaré encarrega de criar o mundo, e lhe dá os poderes (abá e axé) do mundo (é por esta razão que é saudado com a expressão "Alabalaxé").

Obatalá os examina, coloca um sob o boné e o outro dentro do seu saco. O saco da criação que Olodumaré lhe confia. Antes de partir, ele vai a Orunmilá pedir-lhe a palavra, o caminho que ele deverá seguir e o que deverá fazer.

Orunmilá lhe diz: "Olodumaré lhe confiou a criação de um outro lugar. Faça uma oferenda para ser capaz de realizá-la e para que a realize com perfeição".

Obatalá, que é muito obstinado, respondeu: "Oh! Orunmilá! A missão que tens, nós te demos, foi por nós decidida, antes que fosses criado! Olodumaré e eu, Oxalá!

Olodumaré, que é Deus Supremo, me envia em missão. Eu, sua segunda pessoa. Tu, Orunmilá, me dizes agora, que devo fazer oferendas para ser capaz de realizar meu trabalho com sucesso!

Que acontecerá se não faço oferendas? Oferendas para a missão que vou realizar? Eu, portador do poder (abá e axé), alabalaxé! Mas, por que? Que necessidade de fazer oferendas?" Obatalá contradiz Orunmilá. Ele tapa os ouvidos, recusando-se a escutar, e não faz as oferendas.

Todos os outros Imalés vão consultar Orunmilá. Este escolhe para cada um deles uma oferenda determinada. Olofin-Odudua é o que mais se evidencia. É uma espécie de Obatalá. Mas ele não tem posição nem reputação comparáveis às de Oxalá. Orunmilá responde: "Se tu fores capaz de fazer a oferenda que vou te indicar, este mundo que criarei, ele será teu. Lá, tu serás o chefe!"

Olofin pergunta qual é a oferenda. Orunmilá lhe diz que ofereça quatrocentas mil correntes. Que ofereça uma galinha que tenha cinco garras, que ofereça um pombo, que ofereça um camaleão, que ofereça, ainda, quatrocentos mil búzios.

Olofin-Odudua faz a oferenda completa. Chegou o dia de criar o mundo. Obatalá chama todos os outros Imalés. Eles começam a caminhar e se vão. Já na estrada, eles chegam à fronteira do além.

Exu é o guardião (onibode) desta fronteira e o mensageiro dos outros deuses. Obatalá recua-se a fazer oferendas neste lugar, para que a viagem seja feliz. Exu aponta uma cabacinha mágica na direção de Obatalá.

A sede começa a atormentá-lo. Ele vê um dendezeiro. Agita seu cajado de estanho (opaxorô) e se serve dele para perfurar o tronco da palmeira. O vinho escorre copiosamente.

Oxalá se aproxima e bebe à vontade. Ele está plenamente satisfeito, mas fica embriagado. Ele não sabe em que lugar está, nem o que faz. O sono o invade e ele adormece à beira da estrada. Dorme profundamente e ronca.

Todos os outros Imalés sentam-e à sua volta. Respeitosamente, eles não ousam acordá-lo. Esperam que ele acorde espontaneamente.

De repente, Olofin-Odudua levanta-se e apanha o saco da criação, caído ao lado de Obatalá. Ele volta a Olodumaré e diz: "A pessoa que fizeste nosso chefe, aquele a quem entregaste o poder de criar, bebe muito vinho de dendê. Ele perdeu o saco da criação. Eu o trouxe de volta!"

Olodumaré responde: "Ah! Se assim é, tu que encontraste o saco da criação toma-o, vá criar o mundo!" Então, Olofin-Odudua volta aos Imalés reunidos. Toma as quatrocentas mil correntes e, ainda no além, amarra-as a uma estaca.
Ele desce até a extremidade da última corrente, de onde vê uma substância estranha, de cor marrom.

É terra! A galinha de cinco garras voa e vai pousar obre o montícolo. Ela cisca a terra e a espalha sobre a superfície da águas. A Terra se forma e vai e alargando cada vez mais.

Odudua grita: ”Ilè nfè!”(a terra se expande), que veio a ser o nome da cidade santa de Ilê Ifé. Olofin-Odudua coloca o camaleão da oferenda sobre a terra. Ele anda sobre ela com passos cautelosos.

Odudua só ousa descer porque está atado à ponta da corrente. A terra resiste e ele caminha. Seu olhar não pode alcançar os limites. Todos os outros Imalés ainda estão no além. Odudua os convida a descer sobre a terra.

Apenas alguns deles o seguem; os demais permanecem sentados à volta de Obatalá adormecido. Obatalá acorda, enfim. Ele constata que o saco da criação lhe foi roubado.

"Ah! Quem ousou fazer este furto?" Os deuses que permaneceram fiéis lhe dizem: "Foi Odudua que se apoderou do saco da criação".

Ele entende o que ocorreu. Encolerizado, Obatalá volta a Olodumaré e queixa-se do roubo do qual foi vítima. Olodumaré lhe pergunta: "Que fizeste para adormecer assim?"

As pessoas desta época não mentiam jamais. Obatalá, responde com sinceridade: "Eu vi uma palmeira de dendê, furei o seu tronco com o meu opaxorô. Deste furo começou a sair água. Dela eu tomei e adormeci."

"Ah! diz Olodumaré, "não beba mais, nunca mais, desta água. O que fizeste foi grave!" Por esta razão, até hoje, o vinho de dendê é proibido a Oxalá e a seus descendentes.

Olodumaré declarou: "Não tendo criado a Terra, tu criarás todos os seres vivos: os homens, os animais, os pássaros e as árvores".

FONTE DO TEXTO: VERGER, Pierre Fatumbi. Lendas africanas dos orixás. 4.ed. Salvador: Corrupio, 1997.

FONTE DA IMAGEM: http://www.juntosnocandomble.com.br/2014/08/a-lenda-da-criacao-do-mundo-os-orixas.html

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